Brother Soul em Festa

O sábado, 22 de abril, foi de muita alegria e em tom de comemoração no Conjunto Jatobá I, no Barreiro, em Belo Horizonte. A Festa pela Paz, que durou o dia todo, começou com o Congado e terminou com a esperada e muito aplaudida apresentação do grupo Brother Soul. O evento, realizado por mestre Tito, teve batizado de capoeira e foi regado a muito rap. O público esteve presente do início ao fim. Além de pessoas da comunidade, a Festa pela Paz atraiu gente de diversas partes da capital mineira. A simples realização do evento seria suficiente para manter a alegria, não fosse um fato recente, motivo de orgulho para O Conjunto Jatobá I: a participação do Brother Soul no DVD da funkeira carioca Fernanda Abreu. A equipe de reportagem da ONG Favela é Isso Aí aproveitou um dos poucos momentos livres do dia da festa para conversar com Brother Soul sobre a gravação com a cantora. A breve a reunião, na casa de Mestre Tito, foi o tempo que precisávamos para entender o motivo do convite e a longevidade do grupo.

Brother Soul no DVD da Fernanda Abreu

Mestre Tito conta que Fernanda Abreu tomou conhecimento da existência do grupo pelo famoso DJ Malboro. Segundo ele, a cantora estava precisando de grupos que dançassem o bom estilo James Brown, para participar da gravação do novo DVD e o Brother Soul acabou sendo indicado. De acordo com Mestre Tito, a quantidade de shows e viagens que o grupo faz, contribuiu muito para dar visibilidade. Ele cita, em especial, apresentações fora do estado e lembra, com carinho, da participação no Guia Cultural de Vilas e Favelas. "Badaladíssimo mesmo foi quando lançou o Brother Soul no Guia Cultural. Nós ganhamos outra roupagem. O Guia tirou a gente do gueto e apresentou pro restante da sociedade", conta. Clarice Libânio, coordenadora da ONG Favela é Isso Aí, foi privilegiada, ao ser uma das primeiras pessoas a saber do convite recebido pelo grupo. "Eu liguei imediatamente para Clarice, que deu a maior força", revelou. Da gravação, nos dias 29, 30 e 31 de março, o grupo trouxe alegria e muita esperança. "O Brother Soul sempre esperou as maiores oportunidades e nós sempre fomos muito felizes. Eu espero que essa parceria seja um sucesso e nos traga mais e mais oportunidades".

A longevidade do grupo

Juntos fazem mais de duas décadas, Mestre Tito, Adão, Adenauer e Conrad revelam o segredo da união: "O Brother Soul foi criado para nunca terminar. Nós plantamos uma semente para dar frutos, para nossos filhos, nossos amigos continuarem", revela Mestre Tito. Quando perguntados sobre o principal ingrediente para manter a longa vida, a resposta foi simples: "respeitamos uns aos outros". "Brother Soul é muito unido, nós somos bons amigos, um é compadre do outro, queremos levar isto pro resto da vida", completa o Mestre. Quem vê o Brother Soul no palco não acredita que o grupo nunca ensaiou, a apresentação acontece em cima do palco e a sintonia é impressionante. "Quando fala Soul, entrou no palco, acabou. Nós nunca ensaiamos", diz com orgulho Conrad.

A Festa Pela Paz

"O Jovem precisa de diversão, ele não precisa de mais nada. Tem que ser cara do morro, fazendo coisa para o morro, foi o que aconteceu aqui hoje", descreveu Mestre Tito. Áurea do grupo de rap DejaVu, não se apresentou, mas também esteve presente. Ela avaliou a festa como um momento importante na produção cultural das vilas e favelas da cidade. "Essa iniciativa que esta acontecendo aqui hoje representa uma das várias forças que a gente tem na periferia, que é de reunir a comunidade para integrar, se divertir conjuntamente, tendo um sentido político para isso que é o hip-hop, que traz a importância do engajamento social, de refletir sobre a realidade, de trazer uma postura crítica sobre o que a gente vivencia cotidianamente. Aqui tem crianças, adultos idosos, todo mundo se divertindo. É uma integração na positividade".
Russo, do grupo APR, mandou rap-consciência por mais de uma hora de apresentação, com a filhinha pequena, que também cantou. Ele aproveitou o show para falar sobre o papel da mulher na sociedade: "Eu já venho buscando há tempos, junto com o Hip-Hop Chama e o D-ver-cidade Cultural, uma discussão sobre sexualidade, gênero e redução de danos", disse. Ele revelou também que, além das próprias letras, o rap e a música, de uma forma geral, podem ser utilizados como estratégias para a introdução da discussão sobre política e sociedade entre a juventude. "A gente coloca como iniciativa um movimento musical, cultural, pra rapaziada se apresentar, em contrapartida a gente discute política pública. A gente chama a atenção do jovem para ele colocar a música pra tocar e quando eles começam a se sentir parte do processo, começam a discutir políticas públicas, a falar o que eles querem", revelou Russo.

Incentivo do Governo

O Brother Soul está satisfeito com a nova visibilidade, mas reclama reconhecimento governamental. De acordo com eles, a burocratização oferecida pelos órgãos públicos é uma barreira para esse reconhecimento. "O Brother Soul tem que ser reconhecido e ressarcido por representar o soul em Belo Horizonte. Nós nos apresentamos desde 1983, só dançando Soul", desabafa Tito. De acordo com ele, as exigências feitas pelos equipamentos de cultura governamentais para a inserção em alguns processos artísticos trazem dificuldades para os artistas leigos. “É um monte de papel, tem que preencher um tanto de coisa, eu sou uma pessoa extremamente leiga. Eles não podem impor barreira”, diz Tito.

Apoio da Mídia

Na avaliação do grupo, a cobertura que a imprensa oferece para a arte a cultura na periferia de Belo Horizonte ainda é insuficiente. Apesar da decepção, o grupo acredita que é preciso mudar essa realidade. Na opinião deles, a atuação da mídia pode ser uma forma de alterar a imagem que muitas pessoas têm da periferia. Para o evento do dia 22, o Brother Soul tentou mobilizar a imprensa da capital, mas a festa foi contemplada apenas pelos jornais o Tempo e Estado de Minas, que receberam agradecimentos durante entrevista à equipe Favela é Isso Aí.

Acompanhando a equipe Favela Notícias

Quando a equipe de reportagem da ONG chegou ao Conjunto Jatobá I, já havia escurecido. De imediato, a esposa do Mestre Tito, que nunca havia nos visto, foi logo se aproximando e nos identificando. De lá foi um pulo até a casa do Mestre, que fica na rua onde acontecia o evento. Ele nos apresentou a academia de capoeira, que é uma extensão da varanda da própria casa, mas que atende com todo aconchego os alunos de Sr. Tito. Na porta do quarto dos filhos e nas paredes da academia, a paixão pela black music estampada por todo lado: James Brown, Jimmi Cliff, Peter Tosh e muitos os ícones da música negra. Na hora da entrevista, além da camisa do batizado, com homenagem a ONG (uma surpresa), Mestre Tito e Conrad não deixaram de oferecer uma cerveja gelada e um bom vinho. Depois do bate-papo, a equipe do Favela teve o prazer de sair da casa de Sr. Tito com o grupo vestido a caráter. A arrumação foi nos intervalos da entrevista. Às dez da noite, no último momento da festa, a apresentação do Brother Soul deixou o púbico pedindo Bis.