Beco também é galeria de arte

A VIVA – Associação Comunitária da Vila Presidente Vargas, através de um dos seus projetos, o Arte Favela, promove uma iniciativa cultural, no mínimo inovadora: a montagem de uma galeria de arte no Beco Um, na Vila Presidente Vargas, no Bairro Goiânia.
A exposição será composta por seis painéis de 2×1,6 metros, todos releituras grafitadas de obras clássicas do Modernismo. O projeto foi viabilizado através da Lei Estadual de Incentivo à Cultura, com patrocínio da Telemig Celular e apoio cultural da ONG Favela é Isso Aí, Fundo Cristão para Crianças e Gráfica O Lutador.
A escolha e adequação do espaço levou em conta a amplitude do beco escolhido e foi articulada com os moradores, que vão permitir a exposição das telas nas fachadas das casas. “Cada barraco terá um painel. A idéia de montar uma galeria de arte na favela surgiu porque o grafite está nas ruas, nos becos e não em espaços fechados. Além disso é importante levar arte às pessoas que não tem acesso a ela. Vamos convidar a comunidade, os parceiros, a mídia, pessoas ligadas à arte, escolas públicas e universidades. Os grafiteiros envolvidos no projeto vão estar presentes no local para explicar sobre as obras originais e as releituras que fizeram. Desejamos fazer uma exposição itinerante, levar os painéis para espaços públicos de Belo Horizonte, galerias de arte e montar uma instalação na Praça Sete”, conta Hely Costa, coordenador do Projeto Arte Favela.
São trinta jovens grafiteiros participantes do projeto, que se dividiram em grupos de cinco para a elaboração dos painéis. O projeto Arte Favela já trabalha com Hip-Hop e Hely sugeriu aos alunos pesquisar artistas plásticos brasileiros da arte contemporânea para possibilitar uma fusão de grafite com as artes plásticas.
A escolha das obras e do Movimento Modernista foi feita pelos adolescentes, que descobriram no Modernismo elementos plásticos e temáticos próximos à realidade vivenciada por eles. Foram realizados, no espaço da VIVA, encontros sobre história da arte com a proposta de estimular nos jovens uma visão crítica acerca das obras. Os grafiteiros pesquisaram sobre História da Arte em bibliotecas e em sites da internet. ”Os próprios adolescentes definiram o movimento artístico que seria trabalhado. O Modernismo chamou a atenção pelo teor de crítica social: a denúncia da miséria contida nas obras de Portinari e a Antropofagia, nas obras de Tarsila”, explica Hely Costa.
“Abaporu” e “O Ovo e O Urucu”, de Tarsila do Amaral; “Os Retirantes” e “Os Meninos e O Carneiro”, de Portinari e obras do artista Amílcar de Castro estão entre as releituras. Segundo Wesley Alves de Abreu, grafiteiro e monitor do projeto, existe uma similaridade entre o grafite e as obras modernistas: ”O grafite está presente nas nossas vidas, é uma expressão da periferia e o Modernismo, como o grafite, é uma expressão artística contemporânea. São abordados muitos temas sociais como na obra ‘Os Retirantes’, que representa as pessoas que deixam o sertão saem para as cidades e constroem as favelas.” Wesley analisa outra releitura: “Cândido Portinari aborda um tema que achei o mais interessante na obra ‘Meninos com o Carneiro’, ele tem uma idéia diferente sobre crianças que na tela aparecem brincando em balanços e gangorras, fazendo malabares, como se fossem anjos. Transportei a idéia para os dias atuais, pintando crianças fazendo malabares no semáforo, mostrando a desvalorização do trabalho e o que as crianças sofrem hoje.”
A iniciativa mostrou mais uma vez que o hip-hop pode contribuir para o estudo de História da Arte na periferia e propiciar o diálogo entre diferentes movimentos culturais. César Maurício, artista plástico e músico da banda Radar Tantã, membro da diretoria da ONG Favela é Isso Aí acredita que o hip-hop pode representar um canal para viabilizar a educação artística dentro das favelas: “É uma forma interessante de, através do grafite, proporcionar outras vivências aos adolescentes, com outras linguagens que antecedem o grafite. Ajuda os alunos a ver possibilidades que auxiliam na execução do próprio grafite”, diz.
Sobre a releitura do modernismo, César Maurício acredita que tenha sido uma escolha importante. “O Modernismo foi importante pro resgate e para a busca de uma linguagem muito particular das artes plásticas, trabalhando elementos da cultura nacional. O grafite feito no Brasil não tem elementos que o caracterizem e o diferenciem de outros feitos no exterior. A mostra propõe uma discussão desse aspecto e pode realizar avanços nesse sentido, de agregar ao grafite nacional elementos da cultura brasileira “, constata.

Arte e Favela
A realização do evento Arte Favela no Beco: "Exposição Releituras Obras Brasileiras" é um resultado significativo das ações de arte e educação na periferia, que além muito além das mostras, efetua um processo de conscientização e até de profissionalização. É o caso de Wesley, que está no projeto Arte Favela há quatro anos e lá desenvolveu as técnicas de desenho e grafite: ”Aprendi não só conhecimentos técnicos. No projeto adquiri conhecimentos sobre a vida, sobre a comunidade em que vivo e sobre o mundo. Hoje eu sou um dos monitores do projeto Arte Favela e oficineiro do Programa Escola Aberta”, relata.
O projeto, criado em 2003, forma adolescentes, entre 12 e 19 anos, no contexto da cultura hip-hop (Break, DJ, Rap e Grafite) e das artes contemporâneas. Hoje, o Arte Favela atua em três grupos: grafiteiros (fusão do grafite com as artes acadêmicas), Break e o Arte Favela Banda (Fusão Rap e Ritmos brasileiros) formada por membros do próprio projeto.

Evento: Arte Favela no Beco "Exposição Releituras Obras Brasileiras"
Local: Rua Tucano Beco 01, próximo ao n° 45 – Vila Presidente Vargas / Bairro Goiânia
Data: 15/07
Horário: 14h
Ponto de Referência: Ponto final do ônibus 5503 A (Pegar na Avenida Paraná, Avenida Augusto de lima ou na Avenida Santos Dumont).
Informações: Associação VIVA – tel: 3486-3049
Hely Costa – 8846-5644 – [email protected]