Um “Outro Olhar”

Um “Outro Olhar” este é o nome da mostra fotográfica realizada por jovens do Programa Fica Vivo, em parceria com o SENAC e Puc Minas no Museu Histórico Abílio Barreto, no dia 28 de junho. A abertura do evento aconteceu no auditório do Museu, com a presença dos jovens fotógrafos participantes do projeto e dos fotógrafos João Castilho, de Belo Horizonte, co-fundador do blog “Diário dos Olhos” e do site Paisagens Submersas, Milton Guran, fotojornalista, autor de livros, mestre em Comunicação Social, doutor em Antropologia Social e Etnologia e atualmente professor do Instituto de Humanidades da Universidade Cândido Mendes do Rio de Janeiro e do francês radicado no Rio de Janeiro, Vincent Rosenblatt, coordenador da ONG e agência fotográfica “Olhares no Morro”.

Dos dezesseis jovens, oito subiram ao palco para falar como foi a experiência do fazer fotográfico para eles. O desejo de tornarem-se fotógrafos profissionais foi unânime. Relataram algumas vivências no período em que estavam envolvidos com a fotografia e afirmaram que com a câmera em punho, puderam conhecer melhor a comunidade em que vivem e revelar ao público um “Outro Olhar” sobre a vida na favela, fugindo do estereótipo formado pelo senso-comum e pela mídia, de que nas favelas há somente violência, crimes e batidas policiais. “Nós tivemos a oportunidade de mostrar o lado bom de onde vivemos. A Pedreira não tem o lado só da violência, da crueldade, onde não há espaço para que os jovens mostrem os jogos, as danças e a criatividade que cada um tem dentro de si, na periferia. Tivemos a oportunidade de mudar essa visão, buscando o lado positivo”, afirma Kelly Andrade Barbosa, moradora da Pedreira Prado Lopes.

No decorrer do debate, o público pôde visualizar fotos de João Castilho, que desenvolve trabalhos com comunidades do Vale do Jequitinhonha, pelo projeto “Paisagens Submersas” viabilizado pela Lei Estadual de Incentivo à Cultura. Castilho realçou a importância de levar as fotos para os moradores do Vale, que têm pouco ou nenhum acesso à fotografia e por isso não têm a oportunidade de registrarem suas vidas visualmente e historicamente. A discussão acerca da contrapartida social do projeto foi levantada pelo público e explicada por ele: “Essas pessoas não possuem acesso à fotografia, as poucas fotos que vi eram de casamentos. Toda vez que retorno ao local, levo comigo fotos tiradas dos moradores e entrego a eles em mãos, permitindo que essas pessoas possam guardar alguns momentos das suas vidas.”

Sobre “Um Outro Olhar”, Castilho avalia: “A fotografia é muito importante para esses jovens, assim como foi importante para mim. É um instrumento que vai muito além de informar ou de relatar algo. É um instrumento de autoconhecimento, de conhecimento do outro, do espaço que está em volta e do espaço distante. O processo fotográfico que os jovens tiveram acesso é que é transformador.”

Depois foi a vez de Vincent Rosenblatt expor o portifólio da Agência Fotográfica Olhares no Morro. O trabalho coordenado por Rosenblatt e realizado com jovens das favelas do Rio de Janeiro representa um pólo de criação fotográfica entre arte e documento. O objetivo principal do projeto é capacitar os moradores formando uma rede de correspondentes dentro das comunidades, para a criação, com qualidade, de um acervo de imagens, gerando renda para os participantes. “A venda das fotos proporciona um ganho de 60% para os fotógrafos e 40% são destinados para custear a produção das mesmas”, explica Rosenblatt.

O universo dos bailes funk e de travestis moradores da Rocinha foi transformado em imagens, pela equipe da Olhares no Morro, com muita sensibilidade. Daniel Martins, membro da Olhares no Morro e correspondente na Rocinha, expôs seu portifólio no qual optou por trabalhar o tema “Sexo na Adolescência”. Pelo seu olhar fotográfico, as imagens de meninos folheando revistas de nu feminino e do primeiro beijo, adquiriram uma roupagem poética, mostrando a diversidade de temas que estão inseridos no contexto das favelas. Sobre a repercussão das fotos produzidas nas favelas do Rio de Janeiro no exterior, Rosenblatt afirma: “A receptividade é ótima. Há muito espaço para este olhar. Inclusive fomos convidados a participar da Art Basel, em Miami Beach, a maior feira de arte contemporânea das Américas, convidados como “Art Institution”. Lá tivemos contato com a nata do mundo de fotografia de arte”.

Em entrevista para a Agência de Notícias Favela é Isso Aí, Guran avalia a mostra “Outro Olhar”: “Sentimos um engajamento e uma forte relação com o que foi fotografado. A fotografia é um pedacinho de vida. O que interessa realmente na fotografia é a vida que está por trás da foto. O jovens fotógrafos do projeto tem essa ‘pegada no olhar’, é isso que faz um bom fotógrafo. Se a técnica fosse tudo, bastava fazer faculdade de letras para se tornar poeta. São jovens que se dispuseram a interpretar e compartilhar a realidade, a partir das suas visões de mundo.”

A exposição foi aberta logo após o debate e o público pôde ver de perto as impressões que foram captadas pelas lentes, fruto da mobilização dos dezesseis jovens que saíam pelas comunidades, após as aulas técnicas e teóricas, que fizeram no SENAC. As comunidades fotografadas foram sete, participantes do Programa Fica Vivo!: Alto Vera Cruz, Cabana do Pai Tomás, Conjunto Felicidade, Morro das Pedras, Pedreira Prado Lopes, Ribeiro de Abreu e Taquaril. As fotos foram feitas com câmeras profissionais e filmes P&B.

A ambientação sonora do evento ficou a cargo do DJ Easy, produtor cultural, diretor do selo Xeque Mate, integrante do grupo de rap CDA e membro das equipes de Hip Hop: A Corja e Conspiração Subterrânea Crew. Nos sets, Easy privilegiou clássicos do rap mineiro, francês e mundial.