Periferia e religião: um cenário de motivações diversas

As pesquisas realizadas pela equipe do Favela é Isso Aí apontam para uma forte presença religiosa nas vilas e favelas da capital. Além das próprias igrejas católicas, evangélicas e centros espíritas, são encontrados muitos grupos religiosos de dança, música e liturgia. O congado é também uma tradição em muitas comunidades. Pesquisas divulgadas nos últimos anos, entre elas uma denominada “Retratos das religiões no Brasil”, de 2005, da Fundação Getúlio Vargas, revelam que o segmento dos evangélicos tem crescido muito no país e em especial na periferia. Enquanto nas zonas rurais o percentual de evangélicos é de 10,15%, nas periferias é de 20,72%, ou seja, mais do que o dobro. De acordo com a pesquisa da FGV, a difusão das igrejas evangélicas é maior entre os desempregados e inativos.

Para o professor da disciplina de cultura religiosa da PUC – Minas, Carlos Frederico Barboza de Souza, a migração religiosa na periferia é mais intensa. Ele acredita que o aumento do número de evangélicos tenha a ver com a forma como as igrejas se organizam. De acordo com ele, os evangélicos estão menos ligados às questões sociais e mais voltados para o exercício religioso, o que acaba atraindo muitas pessoas. “Eu consigo ver que é mais intensa a presença evangélica, pelo tipo de presença que as lideranças evangélicas têm”, analisa.

Apesar do crescimento da adesão entre os evangélicos, o Brasil continua sendo o país com mais católicos no planeta. De acordo com a pesquisa da FGV, a participação é maior no meio rural do que nas grandes cidades. O percentual nas regiões rurais é de 84,26%, nas capitais é de 67,95% e nas periferias das regiões metropolitanas é de 65,68%. Para Dom Walmor Oliveira de Azevedo, arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, a tradição religiosa é muito forte entre os mais pobres. “Eu constato isso, pessoalmente, é um povo de uma riqueza muito profunda, o que, inclusive, nos questiona como igreja em termos de assistência e de presença em relação às pessoas que vivem em vilas e aglomerados. Ali nós vemos o cultivo de tradições religiosa profundas, mostrando a luta pela vida, o enfrentamento do sofrimento e a abertura de um novo horizonte, que tem na experiência religiosa, do encontro com Deus, uma luz muito importante, luz que muitas pessoas que vivem no bem estar, por conta do bem estar, apagam, são indiferentes”, analisa.

O professor Carlos Frederico não acredita que a pobreza seja o principal fator para a adesão religiosa. Na avaliação dele, as pessoas estão em busca de um sentido para a vida, independente de serem ricos ou pobres. “Cada ser humano tem suas necessidades. Para uns são materiais, mas você tem a depressão, a falta de sentido, as crises pessoais. Não é só a necessidade material que causa a busca religiosa, é mais um sentido de inserção social e sentido de vida”, analisa.

Segundo ele, a periferia recebe esses estereótipos, até contraditórios, de violência, de religiosidade, o que muitas vezes, não condiz com a realidade. “Existe na cultura brasileira que pobre é quem procura religião, pobre é violento. Mas a violência está por toda parte, não esta apenas nas favelas. No entanto este local é considerado um lugar ruim. O eu que não é verdade. Eu mesmo já trabalhei muitos anos em favelas, conheço a realidade”, diz.

No entanto, o professor explica, sem julgar, que o acesso à universidade, muitas vezes, afasta as pessoas da religião. “O que eu acho é que quem tem acesso ao que eu chamaria a cultura do iluminismo, muitas vezes, acaba se afastando da religião, há uma tendência a se afastar do ambiente religioso. E esse contato com o iluminismo se dá mesmo é na universidade”.

Na avaliação de Dom Walmor, o comportamento das comunidades periféricas mostra o caminho para um mundo melhor. “As comunidades mostram a luz que nós precisamos para enfrentar as questões sociais, políticas e existências. Eles têm na experiência da fé, vividas nas tradições religiosas, uma grande força e esse é um testemunho bonito que nós encontramos. Essa é uma riqueza que nós prezamos muito e que precisamos cultivar, exatamente porque é um veio d’água que foram rios importantes para mudar o coração do mundo e dos que podem mudar muitas coisa e não mudam porque não estão marcados com a mesma luz desta fé”, analisa.

FONTES:
1) Dom Walmor Oliveira de Azevedo – arcebispo metropolitano de Belo Horizonte
Telefone: Assessoria da Arquidiocese de Belo Horizonte – 3269-3129
2) Carlos Frederico Barboza de Souza – Professor do Departamento de Filosofia e Teologia da PUC Minas
Telefone: Assessoria de comunicação da PUC Minas – 3319-4108