Funk: cada um no seu quadrado

Para grande parte da população o funk está sempre relacionado à música produzida nos morros cariocas. Embora difundido por todo país, no Brasil tornou-se quase que um produto do Rio de Janeiro. Hoje, as músicas mais tocadas nas emissoras e ouvidas pelo grande público são as que têm algum tipo de apelo sensual, feito através das letras e de coreografias. Mas o que é produzido de funk, atualmente, no Brasil? Quais são as vertentes desse segmento musical no país? Quem faz e onde é feito o funk? Qual é o papel desse estilo musical na sociedade?

A origem do funk

Segundo estudiosos, o funk originou-se do soul. Música produzida nos Estados Unidos, na década de 60, o soul é a união do rhythm and blues e do gospel, música protestante negra, que teve à frente músicos como James Brown e Ray Charles.

De acordo com o sociólogo Hermano Vianna, na sua dissertação de mestrado “O Baile Funk Carioca: Festas e Estilos de Vida Metropolitanos”, em 68, o soul já tinha se transformado em um termo vago e perdia a pureza revolucionária dos primeiros anos, passando a ser encarado por alguns músicos negros como mais um rótulo comercial. Ainda segundo Vianna, foi nessa época que a gíria funky, considerada uma espécie de palavrão, que significava mal-cheiroso e estranho, começou a ser motivo de orgulho para o negro. “Tudo podia ser funk: uma roupa, um bairro da cidade, o jeito de andar e a maneira de tocar musica, que ficou conhecida como funk”, segundo texto de Hermano Vianna. O soul, que agradava a maioria branca, acabou sendo radicalizado, com ritmos mais pesados e arranjos mais agressivos, levando o nome de funk.

No Rio de Janeiro, o funk foi um desdobramento de um movimento chamado Black Rio que realizava bailes soul em toda a cidade, na periferia e também na zona sul, havendo uma transformação musical “lenta e gradual”. Nesse momento, já se tocava nos bailes o hip hop, que aos poucos substituiu o charme. “Com o sucesso internacional do hip hop a zona sul voltou a se interessar pela black music”.

Para a professora Adriana Facina, da Universidade Federal Fluminense, além desta origem vinculada ao movimento realizado nos Estados Unidos, “também é preciso que se reconheça que o funk é o que chamamos de uma música diaspórica, ou seja, um tipo de música que nasceu nos EUA, mas que foi criada a partir do tráfico internacional de seres humanos, em sua maioria africanos, que também foram trazidos à força para o Brasil. Portanto, o blues, o funk, o samba, a capoeira, as religiões afro-brasileiras são manifestações culturais que têm origens históricas comuns, independente das fronteiras nacionais. Além disso, após mais de 30 anos de presença no Brasil, o funk se nacionalizou, inclusive na sua batida eletrônica, que vai samplear berimbaus, atabaques, tamborins, surdos etc”, diz Adriana.

Funk em Belo Horizonte

Para o MC Jefinho, morador do conjunto Felicidade, a história do funk em Belo Horizonte é tão antiga quanto à história do funk carioca, mas pelo fato de o Rio de Janeiro ter uma concentração de veículos nacionais de comunicação, o funk carioca teve maior visibilidade no país inteiro. Segundo ele, há 12 anos surgiu em BH um movimento chamado Rap Brasil, que envolvia alguns dos DJ’s mais conhecidos do funk atualmente, como, por exemplo, o DJ Malboro. De acordo com Jefinho, o funk tem estilos diferentes. No Rio de Janeiro, de acordo com ele, o que predomina é o funk chamado Proibidão. MC Rodrigo, morador da Vila Pau Comeu, em BH, acredita que em Belo Horizonte prevalece o funk que não é pra dançar. Para ele, as letras das músicas, na maioria das vezes, passam uma mensagem mais social para aqueles que moram nas periferias, o que foge um pouco do padrão carioca.

Na capital mineira, o espaço para o Funk ainda é pequeno. Jefinho enxerga e comemora o aumento da visibilidade, mas acredita que o espaço destinado para o funk ainda é muito pequeno para o público que cresce a cada dia. “As pessoas tem que tocar de graça, não tem um bom espaço, mas mesmo assim atrai muito público por ser um lazer barato”. Ele também acredita que o funk hoje é uma forma de geração de renda. “Ainda são poucos, mas existem artistas que conseguem viver disso”.

Para MC Rodrigo o cenário para quem faz funk na capital vem mudando. Para ele a organização desses bailes mudou o foco. “Ao invés de contratar MC’s de outros Estados, agora se contrata os MC’s daqui”, afirma.

O professor da Faculdade de Educação da UFMG, Juarez Dayrell, em seu livro “A música entra em cena: o rap e o funk na socialização da juventude”, afirma que em Belo Horizonte, esse segmento musical foi construído de uma maneira diferente do que ocorreu no Rio de Janeiro e vem sendo reelaborado, da década de 70 pra cá, com letras que expressam as condições estruturais das cidade e o próprio contexto cultural dos autores. Ainda segundo Dayrell, os temas das músicas expressam aspectos da vivência juvenil e por isso, os MC’s atribuem a eles mesmos títulos de mensageiros da alegria.

O papel social do funk

Gustavo Souza, aluno do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura pela ECO/UFRJ, no seu artigo “Culturas Urbanas Periféricas no Documentário Brasileiro: Funk, Hip-hop e Samba” afirma que as representações culturais, especialmente as relacionadas à música, são importantes não apenas porque apresentam ao jovem um horizonte dissociado da marginalidade, mas também pela forma como ajudam a pensar a sociedade brasileira e, em conseqüência, a problemática da violência urbana.

Segundo Dayrell, a experiência do Funk como forma de expressão sobre insatisfações e desejos pessoais, assume um valor de exercício das potencialidades humanas, como uma forma de afirmação pessoal, reconhecimento do meio em que vive e aumento da auto-estima.

Proibidão e Funk Sensual

Segundo o professor Écio Salles, no seu artigo “O Bom e o Feio: Funk Proibidão, Sociabilidade e a Produção do Comum”, o proibidão é uma vertente do funk que explora de forma de demasiadamente explícita os temas da violência e do crime ou da sexualidade/erotismo, muitas vezes narrando, sem nenhum pudor, situações eróticas vividas ou desejas pelos intérpretes.

Para Adriana Facina, “o funk que toca nas rádios não é o proibidão, mas sim suas versões light. O que toca nas rádios hoje é basicamente o chamado funk sensual, de duplo sentido, faceta mais explorada pela indústria cultural hoje, em detrimento do chamado funk consciente, que era muito forte na década de 1990”.

Funk no Imaginário Social – Memória
Quem é que não se lembra ou nunca ouviu tocar…

“Eu só quero é ser feliz, andar tranquilamente…”
“Era só mais silva que a estrela não brilha. Ele era funkeiro, mas era pai de família…”
“Vai popozuda, vai, vai popozuda…”
“Vou passar cerol na mão, assim, assim… vou mostrar que eu sou trigrão, vou sim, vou sim…”
“Só as cachorras, as preparadas”
“Ado, aado cada um no seu quadrado…”
“Créu, Créu…”
“Agora eu to solteira ninguém vai me segurar…”
“Gatinha, quero te encontrar, vou falar, sou Claudinho… Ziguezaguiei no vira, virou você quis me dar as mãos, não alcançou…”

Sugestão de fontes:

1. Jeferson Sabino – MC Jefinho – Conjunto Felicidade – Belo Horizonte
Contato: 8804-1646

2. Juarez Dayrell – professor da Faculdade de Educação da UFMG
Contato: 3409-4189 assessoria de imprensa da UFMG

3. MC Rodrigo – Pau Comeu – Aglomerado da Serra – Belo Horizonte
Contato: 8513-1792

4. Adriana Facina – professora da Universidade Federal Fluminense
Contato: (pegar contato da assessoria da UFF)